O ex-presidente americano Donald Trump foi condenado, nesta terça-feira, por abuso sexual e difamação no caso movido pela escritora Elizabeth Jean Carroll. A autora de 79 anos processou o republicano no ano ado, alegando que ele a estuprou em uma loja de departamento de Nova York em meados da década de 1990. Contudo, apesar do veredicto unânime do júri, trata-se de um processo civil, não criminal, o que significa que o magnata poderá — ao menos depois desta condenação em específico, entre outros processos nos quais é réu — manter a candidatura à vaga republicana na disputa pela Casa Branca em 2024.
No processo desta terça-feira, o júri responsabilizou Trump por difamar a escritora após ela tornar o caso público e considerou que Elizabeth provou, durante o julgamento, que o republicano a abusou sexualmente. No entanto, rejeitou a acusação de que ela havia sido estuprada — o abuso sexual é definido em Nova York como submeter alguém a contato sexual sem seu consentimento. O ex-presidente terá que pagar US$ 5 milhões (R$ 24,9 milhões) em danos à escritora.
Apesar da conclusão do caso movido por Carroll, Trump ainda enfrenta uma série de outros problemas com a Justiça que envolve desde questões fiscais a civis, e várias com prazos de procedimentos previstos para este ano. As outras investigações em andamento incluem as movimentações financeiras do ex-presidente, bem como questões eleitorais, a invasão do Capitólio em 6 de janeiro de 2021 e a posse de documentos confidenciais do Estado americano.
Ainda que seja réu em vários casos, Trump anunciou em 15 de novembro do ano ado que é pré-candidato à nomeação republicana para a Casa Branca, uma vez que não há nada na Constituição americana que impeça um réu de concorrer à Presidência da República. Os únicos critérios listados pela Carta são que o postulante deve ser um cidadão nato americano e ter mais de 35 anos. Portanto, mesmo que venha a ser condenado, Trump poderia eventualmente voltar a à Casa Branca caso seja eleito.
Veja abaixo quais as acusações nas costas de Trump:
Invasão do Capitólio
Essa é talvez a acusação mais grave na conta do ex-presidente e a única que poderia, em tese, proporcionar uma brecha para torná-lo inelegível. O relatório final da investigação do Congresso americano sobre o ataque de 6 de janeiro de 2021 — quando uma multidão de apoiadores de Trump invadiu o Capitólio para tentar impedir a certificação da vitória do presidente Joe Biden — acusou o magnata de ter “incitado uma insurreição”. Entretanto, ser condenado e até preso não é impedimento para ser presidente da República nos Estados Unidos.
A única possibilidade de tornar Trump desqualificado para o cargo seria enquadrá-lo judicialmente em uma prerrogativa constitucional que especialistas americanos encaram com cautela. A 14ª emenda da Constituição americana prevê que alguém que tenha jurado defender a Constituição ao ocupar cargo público e, depois, participe de incitação a uma insurreição seja desqualificado para ocupar novo cargo.
Contudo, especialistas ouvidos pelo New York Times sobre o tema se mostraram céticos diante da possibilidade de Trump ser enquadrado nessa prerrogativa legal no processo que investiga o comportamento dele durante a invasão do Capitólio. Segundo o jornal, analistas jurídicos ligados ao Partido Democrata explicaram que a “cláusula de desqualificação” não é “auto-aplicável” e precisaria que o Congresso aprovasse uma lei ou uma resolução para esclarecer como ela poderia ser usada nos dias de hoje.
Documentos confidenciais
Outro caso que assombra o ex-presidente é referente à busca, em agosto do ano ado, por agentes do FBI na residência de Trump, em Mar-a-Lago, na Flórida, portando ordem judicial. Levaram 32 caixas com documentos confidenciais do Estado americano, em sua posse desde que deixou a Casa Branca, alguns com selo que indica questões relacionadas a operações de inteligência mais secretas do país.
A legislação americana obriga presidentes e outros altos funcionários do governo a conservar documentos oficiais durante o mandato e entregá-los aos Arquivos Nacionais, ao deixar o cargo. A questão judicial, portanto, gira em torno de esclarecer se o ex-presidente guardou intencionalmente o material secreto e se enganou os advogados sobre a devolução dos documentos.
Em novembro, o promotor especial Jack Smith foi designado para liderar os trabalhos de investigação do caso, mas não está claro qual é a força das evidências. Reportagens posteriores à busca indicam que há divergências entre os funcionários do Departamento de Justiça e do FBI sobre a investigação e possíveis acusações, com dúvidas a respeito da contundência das evidências.
Transações financeiras
A promotora geral de Nova York, Laetitia James, conduziu uma investigação por três anos sobre uma década de negócios do império imobiliário de Trump. O resultado revelou que houve fraude sistemática — o que inclui inflar o valor de mercado dos imóveis para conseguir financiamentos bancários elevados e, ao mesmo tempo, apresentar à receita federal valores mínimos, para evitar o pagamento de impostos.
A promotora pede a devolução de cerca de US$ 250 milhões que teriam sido sonegados. Se a tese for aceita pela Justiça, tanto Trump quanto os filhos seriam proibidos de dirigir empresas no estado de Nova York — em outro caso que não atrapalharia os planos do republicano de voltar à Casa Branca. A análise do caso no tribunal está prevista para começar em 2 de outubro.
Acusação eleitoral
Em abril, Trump, compareceu à Justiça americana para ouvir as acusações que o transformaram em réu por 34 imputações referentes a três casos relacionados à falsificação de registros comerciais antes das eleições presidenciais de 2016, incluindo o suposto suborno de US$ 130 mil da atriz pornô Stormy Daniels para abafar um caso extraconjugal que mantiveram dez anos antes, e que ele sempre negou. Após ouvir as 34 imputações penais, o republicano declarou-se inocente e saiu pela porta da frente do Tribunal Penal de Manhattan, onde uma multidão de apoiadores o aguardava desde o início do dia.
O caso também não impede seus planos de voltar à Casa Branca em 2024. A falsificação de documentos é com frequência uma contravenção em Nova York, mas o argumento-chave da Promotoria é que os registros falsos foram usados para violar leis de campanha eleitoral, o que constituiria um crime ível de quatro anos de prisão. A junção de ambas, no entanto, é uma tese nova e frágil, o que levou juristas a questionarem o custo-benefício de a Promotoria apresentar as acusações, já que não se sabe como serão recebidas.
Direito ao voto
Apesar de dificilmente ser prejudicado politicamente pelas acusações acima, Trump, contudo, talvez não possa votar em si mesmo. Em 22 estados americanos, detentos perdem seus direitos a voto quando estão atrás das grades, mas podem voltar a exercê-los ao serem soltos. Em 15 estados, geralmente ficam sem poder votar por um período subsequente ao encarceramento, geralmente quando estão em condicional ou têm multas pendentes. (Com New York Times e El País.)